O efeito "canguru" revela que pais e filhos estão mutuamente mais compreensivos e tolerantes, capazes de lidar com suas diferenças
O carioca Guilherme Fortins, 30, diz que nunca pensou em sair de casa para morar sozinho. "Só se for para casar ou mudar de cidade", afirmou ele, que trabalha em uma agência de marketing esportivo. O relato de Fortins é retrato de uma tendência nacional, segundo dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgados nesta sexta-feira (29).
Há cada vez mais jovens de 25 a 34 anos, a chamada "geração canguru", morando com os pais. Em dez anos, houve aumento de quase quatro pontos percentuais --de 20,5% para 24,3% entre 2002 e 2012. Desses, 60% são homens.
A "Síntese de Indicadores Sociais", levantamento baseado em números da Pnad 2012 (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), revela que os jovens que moram com os pais --independentemente da motivação, isto é, o estudo não avalia porque esses jovens não saíram de casa-- possuem maior escolaridade média em relação aos demais.
De acordo com a coordenadora da pesquisa, Ana Lúcia Saboia, esse dado indica que opção de viver na casa dos pais pode estar ligada à "maior dedicação aos estudos". Na "geração canguru", a proporção de jovens que estavam na condição de filhos e que continuavam estudando foi de 14%, enquanto para os demais indivíduos de 25 a 34 anos foi de 9%.
Escolha Voluntária
"A decisão de morar com os pais pode se basear em justificativas e explicações diversas que envolvem desde questões financeiras (desemprego, custo habitacional), às questões psicológicas (comodismo) e mesmo sociodemográficas, envolvendo diferentes graus de dependência econômica e familiar. Porém, a questão central que recai sobre essa nova 'geração' é que a opção de morar com os pais é feita de forma voluntária, considerando que a maioria possui condições econômicas de se sustentarem e seguirem com suas próprias pernas"Trecho do artigo "A geração canguru no Brasil", de Ana Lúcia Saboia e Bárbara Cobo
Para Fortins, o único ponto negativo no fato de ainda morar com os pais é a questão da privacidade. "Existe sempre um incômodo. Não é a sua casa e você não pode fazer o que você quiser", disse. No entanto, o jovem acredita que teria uma queda em seu padrão vida caso saísse de casa.
"Há uma mistura de coisas. Tanto o apego com os pais, o costume de já tê-los ali perto de mim, como também a questão do padrão de vida. Sozinho, você vai ter menos dinheiro para sair, para gastar com uma namorada ou com quem quer que seja. Não é apenas virar e falar: "Cansei daqui". Como se eu estivesse trocando de roupa. Isso tem que ser uma coisa pensada porque envolve um compromisso mais sério", argumentou.
"Além disso, tem a questão do preço dos imóveis. Atualmente, eu não vou achar preços acessíveis no bairro onde eu moro [na Tijuca, na zona norte da cidade]. Não vou conseguir um lugar para alugar por menos de R$ 1.500. Dentro de casa você vai ter que bancar tudo e o seu padrão acaba mudando. Às vezes vale mais a pena você manter o padrão e ficar na casa dos pais", completou.
O jovem contou ainda que a maioria de seus amigos se encontra na mesma situação, e que nunca houve por parte de sua família qualquer tipo de pressão para que ele saísse de casa.
"Nunca aconteceu comigo, mas já ocorreu de um amigo meu ter que lidar com brincadeiras da mãe dele, que era aposentada e queria curtir a vida. Ela dizia que ele seria expulso de casa quando se formasse, e o pressionava a casar logo. Mas se formou, não casou e continua lá", disse.
A Pnad é uma pesquisa feita anualmente pelo IBGE, exceto nos anos em que há Censo. No ano passado, a pesquisa foi realizada em 147 mil domicílios, e 363 mil pessoas foram entrevistadas. Há margem de erro, mas ela varia de acordo com o tamanho da amostra para cada dado pesquisado. Leia mais em [uol]
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